As ciências econômicas relacionam-se ao ramo de estudo que busca alocar de forma eficiente recursos escassos entre inúmeras alternativas com o fim de otimizar o bem-estar geral da sociedade. Por essa definição fica claro que o gestor público precisa priorizar o uso dos recursos tendo em vista que eles são limitados.
Contudo, os discursos de diversos candidatos e de parte da imprensa parecem não entender essa limitação matemática, além de não avaliarem os efeitos secundários das soluções mágicas.
Com a aproximação das eleições de outubro, os candidatos à Presidência e seus assessores econômicos participam de diversos programas de entrevistas, palestras e seminários. Pouco a pouco passamos a conhecer algumas de suas ideias.
Em um programa de entrevistas e em debate com outro pretendente à Presidência, um dos candidatos prometeu regularizar a situação dos devedores da lista do SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). A solução viria da distribuição de empréstimos do Banco do Brasil com custo menor do que o dos empréstimos originais a esses inadimplentes. Há várias consequências negativas para o Banco do Brasil:
– redução da governança, pois a concessão de crédito deveria ser pautada por critérios técnicos;
– redução do retorno, pois a remuneração desses títulos deve ser menor do que a dos outros empréstimos concedidos pelo banco;
– aumento do risco da inadimplência.
Ao consumir capital com empréstimos de maior risco, o banco reduziria seus indicadores de solvência e, no limite, poderia precisar de aporte de capital dos acionistas. Como o controlador majoritário é a União, esse aporte demandaria recursos públicos arrecadados da sociedade via tributos. Em resumo, a inadimplência dos devedores do SPC poderia vir a ser bancada por toda a sociedade.
Esses são apenas alguns efeitos. O Banco do Brasil possui ações negociadas em bolsa. Provavelmente o mercado reagiria de forma negativa à operação o que faria o preço da ação recuar. Com isso, o patrimônio dos acionistas minoritários recuaria, dentre eles, o dos fundos de pensão que têm como objetivo prover a aposentadoria complementar de seus participantes.
Esses aportes em bancos públicos são comuns. Recentemente, o governo aprovou um aporte de quase R$ 900 milhões na Caixa Econômica, pois o banco público está tendo dificuldades de atender a regra de solvência financeira definida pelo índice de Basiléia. A farra da concessão de empréstimos dos governos anteriores foi arcada pelo Tesouro Nacional com o dinheiro dos nossos impostos. A conta poderá ser maior, pois outro R$ 1 bilhão já está sendo preparado para possível novo aporte.
Em uma dessas entrevistas ficou claro a dificuldade de alguns analistas políticos entenderem os reflexos secundários advindos de uma intervenção governamental. Um dos candidatos, perguntado se considerava justo uma mulher ganhar menos do que um homem quando exercem a mesma função, respondeu que não poderia intervir no mercado de trabalho privado para resolver essa situação. Lembrou que no setor publico homens e mulheres recebem a mesma remuneração para cargos iguais. Provavelmente, os jornalistas defendem uma atuação mais forte do governo, quem sabe a edição de uma lei a fim de acabar com a injustiça. Contudo, essa nova lei tenderia a produzir efeito inverso com a redução do mercado de trabalho para as mulheres. Essa distorção condenável já tem remédio. As empregadas injustiçadas podem recorrer a Justiça do Trabalho a fim de buscar a equiparação salarial.
A proposta de um partido de esquerda parece não ter aprendido com seus próprios erros na gestão da economia quando distribuiu farto crédito via BNDES sem resultados práticos a não ser o do aumento da dívida publica.
A mágica agora é utilizar nossas reservas internacionais para impulsionar o crédito. Como o economista Francisco Lopes explicou detalhadamente no Valor em novembro passado, essa estratégia acarretará apenas o aumento da dívida publica e piora nos nossos ratings internacionais.
Será que a queda do PIB per capita de 10% em dois anos não serviu como lição?
Outra regra que vem sendo deturpada por vários candidatos é a do teto de gastos. O mantra é dizer que as despesas com saúde e educação serão congeladas. Primeiro, os gastos não serão “congelados”, pois sofrem reajuste pela inflação anualmente. Segundo, a educação por jovem deve aumentar progressivamente com o envelhecimento da população. E, por fim, a lei não impede uma maior destinação à saúde e educação. Apenas exige que outras despesas sejam reduzidas. Será que o Estado Brasileiro é tão eficiente que não haja mordomias e gastos supérfluos que podem ser reduzidos?
Algumas propostas, embora pareçam positivas em uma análise preliminar, são desastrosas. Decidir sobre investimentos nesse momento não é tarefa simples. Os agentes econômicos e o mercado de capitais ficam a espera, e os desempregados, à própria sorte.
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Assino embaixo o que falou, hoje mesmo estava comentando com o meu pai no almoço. Perfeito!
Vejo coerência em sua análise, o problema é que a maioria do nosso povo, não tem acesso a informações relevantes ou simplesmente não consegue entender dessa forma. E é exatamente disso que nossos políticos precisam para se manter perpetuamente no governo.
Na questão da diferença salarial homem-mulher você coloca como única alternativa a edição de lei “para acabar com a injustiça” e que geraria efeitos colaterais como uma menor demanda por mão de obra feminina.
Mas, existe um meio do caminho entre o “não fazer nada e ignorar a demanda democrática” e o “intervir e criminalizar o empresário”. Parte do problema inclusive vem da regulação atual, que gera distinções de benefícios (e, consequentemente, de demanda por trabalho de cada um dos sexos). Vou propor 3 medidas nessa direção e gostaria de ouvir sua avaliação:
Para combater a desigualdade gerada pela regulação atual:
1) igualar / permitir compartilhamento dos tempos de licença maternidade / paternidade.
Hoje mulheres ficam afastadas mais tempo. Logo total de horas trabalhadas é menor, o que as torna menos atrativas como não se obra;
2) Igualar tempo de contribuição pra aposentadoria.
Quem trabalha por mais tempo sobe na carreira mais. Isso gera distorção no salario medo resultante.
Para acelerar a mudança cultural (preconceito / trabalho de homem):
3) Aproveitaria a reforma da previdência e ofereceria, como contrapartida a equalização das idades de aposentadoria, um diferencial pequeno de alíquota previdenciária, tornando custo de mão de obra feminina marginalmente menor para o empregador.
Isso inseriria sinal econômico a favor de grupo que ganha menos e que tem desvantagens.
Com maior demanda o salário médio tenderia a subir um pouco mais rápido e a diferença entre gêneros se reduzir. Sem efeitos colaterais de judicialização, burocracia e perda de competitividade.
Que acha das propostas?
Thiago,
O item 1 é importante, mas uma das principais funções da licença maternidade é facilitar a amamentação. Alguns pediatras recomendam um período de no mínimo seis meses. Logo uma flexibilização entre licença paternidade e maternidade como você coloca poderia prejudicar o período destinado ao aleitamento materno.
O item 2 sofre grande resistência no Congresso. A alegação para não unificar o tempo de contribuição é o da dupla jornada da mulher.
Quanto ao item 3, a princípio parece boa ideia, mas é necessário uma análise mais profunda. Muitas vezes uma ideia bem intencionada esconde efeitos secundários negativos.
Obrigado pelas observações!
Abraços, Andre
Muito obrigado pela resposta.
Sobre o item 1, os pais podem optar por destinar toda a licença à mãe, se assim desejarem. O compartilhamento é uma possibilidade, não uma obrigação. A Suécia é uma referência desse modelo.
Sobre as dificuldades do item 2 no congresso, concordo, é uma barreira. Por isso a compensação proposta no item 3.
Sinto que as discussões nesse tema ficam muito polarizadas entre uma negação radical de qualquer atuação (à revelia da demanda popular) e demandas intervencionistas perigosas, que podem criminalizar o empresário.
Importante a gente tentar puxar o meio termo e a razoabilidade econômica.
Parabéns pelos artigos. Espero continuar contribuindo.
Alguns pontos de fato são bem colocados, porém o texto é bastante unilateral. Seria interessante explanar teorias tanto liberais quanto keynesianas para mostrar os pontos negativos e positivos das propostas.
Tamires,
O uso dos bancos públicos como alavancadores do crescimento podem funcionar no curto prazo, mas trazem reflexos negativos como a (i) inflação e (ii) a distorção alocativa dos recursos dado o diferencial de juros. Veja o que ocorreu com o BNDES nos anos PT com a indução a investimento pouco produtivos que aumentaram a oferta de forma artificial.
Além disso, o risco dos bancos aumenta com empréstimos. A Caixa acaba de necessitar de aporte de recursos públicos. A maioria dos bancos públicos acabaram sendo privatizados após deficiência patrimonial.
Controle do câmbio também defendida por keynesianos tende a afugentar investimentos externos além de ser de difícil implementação.
Abraços, André
Análise imparcial, perfeita, e correta! pena que a maioria dos eleitores são analfabetos políticos e funcionais! o pior é que esta incapacidade de análise prejudica toda uma nação!