Quanto vale a minha firma?

Recentemente um pequeno empresário com nove lojas me perguntou: “Quanto vale a minha empresa?” Ele sabe quanto fatura, quanto retira mensalmente para seu sustento, mas não tem noção de quanto vale a sua companhia. Desconhece o valor do seu ganha-pão, embora saiba quanto custa seu carro e seu apartamento. Será tão difícil calcular o valor de um negócio? Será que as métricas de avaliação utilizadas para se calcular o valor justo das empresas negociadas em bolsa servem para estimarmos o preço de uma pequena empresa?

Sim, essas ferramentas podem ser úteis para se avaliar um pequeno negócio. Primeiro, vamos entender como tem se desenvolvido o conceito de valor ao longo do tempo.

Antigamente, a ótica era patrimonialista. Fazia-se o levantamento dos imóveis e equipamentos, deduziam-se as obrigações e dívidas e a diferença correspondia ao valor do negócio. Na contabilidade, esse resto é chamado de patrimônio líquido. Para empresas negociadas em bolsa, pode-se comparar o valor de mercado da empresa (número de ações multiplicado pela cotação) com o patrimônio líquido. Esse múltiplo é chamado P/VPA (cotação dividido pelo valor patrimonial por ação). Se essa divisão resultar em um número muito acima de um, a ação em bolsa estaria cara. Caso contrário, barata. A lógica desse raciocínio é a de que se comprarmos uma ação pagando um valor menor do que o ativo líquido, estaríamos adquirindo-o por um preço menor do que ele vale. Mas essa métrica tem perdido prestígio, pois apresenta inconsistências. E se os ativos não estiverem contabilizados a valor de mercado? Imagine que o valor contábil dos ativos esteja muito superior ao valor de mercado. O múltiplo pode estar inferior a um, mas uma reavaliação dos ativos poderia facilmente tornar o indicador superior a um. Contudo, essa não é a única restrição do método. Na era do conhecimento, a contabilidade ainda não deu respostas de como se avaliar o capital intelectual representado pelos empregados. (Já abordei esse tema no post “Contratar o Einstein é custo ou investimento?”).

Logo, pela ótica contábil, o valor do negócio do amigo empresário corresponderia à soma dos seus ativos – máquinas e terrenos –, diminuído de suas dívidas (caso houvesse).

Contudo, a ciência financeira evoluiu. Hoje o valor da empresa não está mais atrelado ao custo de aquisição dos ativos. Se o empresário pagou caro ou barato é um problema que ficou no passado. Interessa agora o fluxo de caixa que esse ativo trará no futuro. Aí entra a métrica do fluxo de caixa descontado que é a mais utilizada atualmente para se avaliar um negócio. Ela não é infalível, mas contribui para se ter uma noção sobre quanto o empreendimento vale. Projetando-se as receitas, as despesas e os investimentos e trazendo essa geração de caixa a valor presente por uma determinada taxa de desconto (não se esqueça de que R$ 100 hoje vale mais do que os mesmo R$ 100 no próximo ano), teríamos o valor da companhia.

O valor do negócio do nosso amigo empresário pelo fluxo de caixa descontado seria a geração de caixa de suas nove lojas trazida a valor presente.

O fluxo de caixa descontado é mera matemática financeira. Por isso, a sensibilidade do analista é importante: qual taxa de desconto usar? Quais as premissas para o crescimento da receita? Quanto será necessário investir para as lojas continuarem gerando caixa? O quadro de pessoal precisará ser expandido para manter o crescimento? Faz sentido calcular um valor na perpetuidade?

Posso adiantar que a empresa do empreendedor amigo pode ter dois valores. O primeiro leva em conta apenas o fluxo de caixa gerado pelas nove lojas. Outro cálculo pode considerar a abertura de novas lojas. Indagações devem ser feitas sobre essa expansão:

  1. Será feito via aquisições ou organicamente?
  2. A empresa possui capacidade financeira para essa empreitada? Os recursos serão próprios, dívida bancária ou advindos de franquias?
  3. A administração está preparada operacionalmente para o crescimento?

Por fim, outra métrica seria utilizar o múltiplo FV/Ebitda (valor da firma dividido pela geração de caixa operacional) de empresas listadas em bolsa com atuação no mesmo ramo de negócio do empresário amigo. Como a empresa listada está acessível a qualquer investidor, pois possui ações em bolsa, é justo que seu múltiplo mereça um prêmio sobre o de nosso amigo. Mais uma vez entra a sensibilidade do analista para definir qual será o prêmio justo e para discernir se o Ebitda reportado pela empresa aberta é comparável com o da empresa do amigo.

O mercado acionário é uma fonte de aprendizado para os pequenos e médios empresários espalhados pelo país. Resta difundir esses conhecimentos. Ganhariam esses empreendedores e a economia brasileira.

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6 Comentários

  1. Prezado André, tenho uma dúvida. Muitos dizem que para se avaliar uma empresa, deve-se levar em consideração seu Ebitda. Ele seria o lucro antes dos impostos? Bem, se os sócios, 3 no caso, retiram anualmente 1,2 milhões cada em distribuição além de retirarem 70mil mensais de remuneração, teríamos que cada retiraria por ano 2,04 milhões cada. Neste caso, não deveria levar em consideração esta remuneração? Ou melhor, o valor não deveria ser no mínimo algo que rendesse aos sócios numa aplicação financeira os 2,04 milhões por ano? A 0,5% a.m, 6,17% a.a, falaríamos em 34milhões para cada e ainda deveríamos somar as projeções de faturamento para os próximos anos? Esta avaliação apenas de Ebitda não é errada? 7 vezes o Ebitda ou 8?
    Desde já te agradeço.

    1. Oi Rodrigo,

      O Ebitda já está descontando o pró-labore (“salário”) dos acionistas, bem como os salários dos demais empregados. Logo, a questão sobre a remuneração que você coloca está resolvida.

      Vamos a parcela da distribuição dos resultados. Cada setor possui uma margem Ebitda que deve ser adequada para cobrir investimentos, impostos sobre o lucro e distribuição de dividendos aos acionistas (nas empresas abertas, em geral, ao redor de 25% sobre o lucro). Por essa razão, as margens e os múltiplos EV/Ebitda variam entre os setores, pois cada segmento possui uma necessidade de capex distinta.

      Assim, esse múltiplo de 7 / 8x EV/Ebitda pode ser o justo e estaria atendendo tanto ao pró-labore quanto à distribuição.

      Essa análise é estática. Serve para cias que tenham um crescimento mais estável. Em regra, utiliza-se o Ebitda projetado para os próximos 12 meses. Se a empresa possuir expectativa de crescimento para os próximos anos, mereceria um múltiplo maior. Mas nesse caso, o fluxo de caixa descontado seria uma ferramenta mais adequada.

      Espero ter respondido sua dúvida.

      Abraços

      André Rocha

      Abraços

      André

  2. Fluxo de caixa, a resposta.
    Ao meu ver adequado. Tanto faz o custo histórico dos ativos e passivos.
    O que interessa é quanto caixa a empresa coloca no bolso do dono…
    No caso do nosso amigo Rodrigo Velloso, 2,04 * 3 = 6,12.
    Se a empresa gera um caixa líquido 6,12MM no ano, acho legal o multiplo 8.
    Logo um bom valor pra essa empresa seria 48,96MM (6,12 * 8).
    Poderíamos até colocar uma projeção de crescimento, mas daí teríamos que colocar uma taxa de desconto à valor presente, o que acho que só complicaria o calculo, pra chegar na mesma coisa. E futuro a gente nunca sabe.

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