Fibria e Vale são duas empresas brasileiras de classe mundial. A primeira é a maior produtora de celulose do mundo, insumo para a produção de papel, com capacidade instalada anual de oito milhões de toneladas. Já a Vale é uma das maiores produtoras de minério de ferro do mundo. A oferta tanto de minério de ferro quanto de celulose têm aumentado nos últimos anos. Empresas que produzem commodities possuem características peculiares que as diferenciam de outras indústrias como a de varejo. Assim, qual será o impacto dessa nova oferta sobre o preço dessas commodities? Como se forma o preço desses produtos? A provável consolidação do setor de celulose pode impactar o preço?
A microeconomia classifica os mercados em três tipos: competitivo, oligopolista e monopolista. Empresas de varejo são empresas do primeiro segmento. Dada a multiplicidade de vendedores, a formação de preço é dada pela interação entre demanda e oferta. Os participantes não têm força para ditar os preços. O aumento ou decréscimo da oferta de um vendedor não possui força para afetar o preço. O preço de equilíbrio obedece com rigor ao balanço entre oferta e demanda.
Já Vale e Fibria atuam em mercados com menor número de vendedores, por isso chamado de oligopolista. No mercado de minério, as quatro maiores – Vale, Rio Tinto, BHP e Fortscue – dominam quase 70% da produção mundial e, no de celulose, as dez maiores prevalecem. O preço também é ditado pelo confronto entre demanda e oferta. Contudo, como os vendedores são poucos, ajustes na quantidade ofertada podem interferir na formação do preço, situação distinta da do mercado competitivo.
Projetos de expansão em minério de ferro e em celulose elevaram, nos últimos anos, a capacidade de produção dessas indústrias, o que poderia, em tese, pressionar o preço dessas commodities. Vale com investimentos em Carajás e Fibria com a fábrica Horizonte II também contribuíram para esse aumento da oferta. Contudo, a demanda mais estável na China tem mantido tanto o preço da celulose como o do minério em patamares elevados. O preço da celulose sobe 32% no ano e o do minério se encontra ao redor de US$ 70, preço que muitos consideram excessivo. Mas há outro ponto.
Na divulgação do resultado do segundo trimestre, tanto Vale quanto Fibria sugeriram a possibilidade de administrar a produção caso percebam que a quantidade ofertada esteja excedendo a capacidade de absorção do mercado. O objetivo é evitar que o preço das commodities se deprecie. O oligopolista possui alguma interferência sobre o preço ao contrário do que ocorre no mercado competitivo.
Em teoria, dada a demanda, empresas oligopolistas podem buscar um consenso sobre a quantidade total a ser ofertada de forma a maximizar o lucro de cada empresa. Contudo, organismos de defesa da concorrência impedem ou limitam essa possibilidade. Mas mesmo que pudessem determinar conjuntamente a oferta total para maximizar o lucro individual, existe o interesse próprio de cada uma para não cumprir o acordo. Uma das companhias poderia obter lucro maior, ofertando mais do que o estipulado inicialmente. O preço cairia. Essa estratégia aumentaria o lucro da primeira empresa a descumprir o acordo, mas reduziria o das concorrentes. Contudo, essas não ficariam paradas e também elevariam sua produção, comprimindo ainda mais o preço. Essas interações irão até um ponto no qual não será mais interessante a nenhum “player” se mover. O novo equilíbrio terá uma quantidade total ofertada acima da do acordo inicial e um preço menor. O lucro individual será inferior ao do acordo inicial. Isso é chamado na literatura de “Equilíbrio de Nash” em homenagem a John Nash, premio Nobel de Economia. A situação descrita não é mera curiosidade teórica. Basta ler o noticiário recente sobre o anúncio do corte de produção de petróleo proposto pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), mas que já vem sendo desrespeitado por alguns membros como o Equador.
Em resumo, o preço do minério de ferro e o da celulose depende do balanço entre demanda e oferta. Mas os agentes podem interferir na formação do preço ao reduzir ou aumentar a produção, tomando decisões individuais. Esses não são passivos como os vendedores do mercado competitivo. A provável consolidação do setor de celulose fortalecerá ainda mais o poder das companhias na determinação da oferta. Olho, portanto, na conclusão das negociações da venda da Eldorado e as estratégias de Fibria e Suzano nesse novo cenário.
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André, pequena correção: a nova fábrica da Fibria fica em Três Lagoas, MS, ao lado de outra inaugurada há 8 anos. O nome do projeto é Horizonte II, daí a confusão com Novo Horizonte, SP.
Olá Marcelo
O texto gerava dúvidas mesmo. Fiz a alteração.
Abraços
André
Claudneir Vieira da Silva
Texto muito bom.
Combina o dia-a-dia prático com o embasamento teórico. Esta condição permite extrapolar o raciocínio para outras situações.
Obrigado, Claudenir!
André, parabéns pela análise.
Obrigado!
A pergunta do milhão é: Qual o preço unitário que essas ações podem chegar?
Esfregando as mãos! rs
André, parabéns pela análise.
Gostaria de incrementar ao seu análise que esse Equilíbrio de Nash, onde não há cooperação entre as empresas, na minha humilde opinião, só faz sentido quando analisamos o “jogo” num único período, onde não há repetição.
Considerando que os Oligopolistas querem maximizar a somatória (ou o VPL) do lucro de vários (ou infinitos) períodos, não me parece que a não cooperação seja uma boa estratégia, pois a empresa que não cooperar vai ter um benefício extra somente uma vez, pois após a perda de credibilidade, ninguém vai cooperar no período seguinte.
Em resumo, a somatória (ou VPL) dos lucros vai ser maior se todos cooperarem, mantendo um nível de produção ótimo que maximiza o lucro no curto e longo prazo.
Com a consolidação do setor, sua tese da cooperação imperar aumenta. Sairíamos de um Equilíbrio de Nash para um Equilíbrio de Pareto.
Abraços