Existe um debate histórico entre os adeptos da análise fundamentalista relacionado ao cálculo dos múltiplos P/L (preço por lucro), FV/Ebitda e outros. Deve-se utilizar os resultados passados ou os projetados. O mítico investidor americano Benjamin Graham pregou o uso dos lucros passados ao longo de seu livro “Investidor Inteligente”. Outro americano, Philip Fisher, defendia o oposto em outro clássico “Ações comuns, lucros extraordinários”: os resultados futuros. Que tal tentar mesclar as duas visões? O que essa abordagem indica sobre o grau de confiança dos investidores em relação ao lucro das companhias brasileiras?
O sistema de análise fundamentalista S&P Capital IQ divulga o P/L (preço sobre lucro) do Ibovespa com base no lucro dos últimos 12 meses (o P/L histórico) e o mesmo múltiplo tomando por base o resultado esperado para os 12 meses seguintes, segundo o consenso de mercado. Temos o Ibovespa em pontos no numerador e o lucro das empresas integrantes do índice ponderado pelo seu peso no denominador. Caso dividamos o P/L histórico pelo P/L projetado, chegamos ao lucro projetado sobre o lucro histórico e podemos obter o prêmio ou desconto do lucro futuro em relação ao pretérito.
Em condições normais, espera-se que os analistas estimem um lucro futuro superior ao lucro passado. Logo, é natural que a razão apresente um prêmio. Contudo, em momentos de crise, as estimativas de lucro caem e ficam em alguns momentos até mesmo inferiores ao lucro passado.
O Brasil, infelizmente, passa por essa fase. Com a confirmação da reeleição de Dilma Rousseff, em outubro de 2014, e, como consequência, o prosseguimento de suas políticas inconsistentes, a razão descrita acima entrou em uma espiral descendente. A entrada do ministro Joaquim Levy, no início do segundo mandato, deu um alento, fazendo com que o lucro esperado se elevasse, mas a percepção de que a presidente mostrava resistência à adoção de políticas econômicas sensatas fez o indicador desabar novamente. Essa tendência só se reverteu quando surgiu a possibilidade de sua destituição via “impeachmnet”.
A relação atingiu seu ápice na aprovação do seu impedimento em abril de 2016. A expectativa de que o governo Temer poderia aprovar reformas que melhorassem o ambiente de negócios e a situação fiscal manteve o indicador em níveis elevados. Contudo, ele recuou fortemente ao fim de 2016 quando se vislumbrou que as aprovações não seriam favas contadas e que integrantes do governo também eram investigados. A aprovação da lei do teto dos gastos e o encaminhamento da reforma trabalhista e da previdenciária deram novo alento, fazendo com que a razão se elevasse.
A delação do controlador da JBS pôs uma pá de cal na expectativa de que a agenda pró mercado prosseguisse, além de a situação do presidente ter se tornado dramática. Em 11 de julho, o lucro futuro das empresas integrantes do Ibovespa superava o lucro passado em apenas 1%.
A entrada de um presidente interino e o encaminhamento das reformas podem fazer a expectativa melhorar, elevando a estimativa de lucro das companhias. Contudo, apenas a eleição de um candidato em 2018 comprometido com a situação fiscal do país poderá elevar de forma definitiva as projeções de resultado das companhias brasileiras.
Até lá, a economia deve continuar maltratando a parcela da população que depende da geração de riqueza das empresas do setor privado. Os políticos e o funcionalismo público, por ora, passam ao largo da crise. Contudo, aquelas empresas não terão como continuar pagando a conta via impostos como indicam as estimativas para seus lucros futuros. Quem sabe se a crise não passará, enfim, a ser “democrática”, envolvendo todos os brasileiros, os do setor privado e os do público.
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Excelente síntese da economia e da política brasileira. Parabéns!
O estamento público, seja os políticos ou funcionalismo, certamente vão provar da crise à medida que os tributos e impostos minguam. O estado do Rio de Janeiro é um bom exemplo.
Uma inflação, desinflação, negativa de 4% originando fuga em massa dos 10.500 fundos de investimento detonara todas as análises. Fundos lastreados em títulos do governo não terão como atender aos resgates. Uma corrida aos bancos pode ser o, lamentável, resultado.
Infelizmente…
Thomas Piketty fez um levantamento do início do século XX até os dias atuais.
Em todas a crise e guerras é renda dos trabalhadores do setor privado é que entra em colapso.
A renda dos funcionários públicos tem leve queda ou muitas vezes nem isto.
E levando-se em conta que os dados abrangem vários países desenvolvidos inclusive aqueles em que o funcionalismo público não tem estabilidade e as leis são praticamente iguais as da iniciativa privada.
A conclusão são duas:
1-Quem decide são os políticos, que não são “proprietários” e portanto tem responsabilidade limitada e transitória sobre a questão, e evitam portanto maiores problemas.
2-Os funcionários públicos tem um poder de pressão muito maior que qualquer trabalhador privado. Só para pontuar uma delas, muitas funções por eles exercidas são monopólio do estado, portanto quando são paralisadas não tem uma segunda opção ou concorrente para amenizar o problema.
Discordo do Thomas Piketty, pois a minoria é função exclusivamente de estado como segurança, justiça e relações exteriores… a grande maioria do funcionalismo público, que está recebendo um calote, vide caso do RJ, é substituível pelo setor privado… acabou o mito da estabilidade no serviço público…