O objetivo último do acionista é ter sua participação em uma empresa retribuída com o recebimento de parte dos resultados. A legislação societária trata dessa questão, obrigando a companhia a definir um percentual mínimo a ser distribuído aos acionistas. Mas, apesar de algumas regras, o pagamento aos acionistas acaba sendo um ato discricionário dos administradores.
São atribuídas a Neném Prancha, roupeiro e massagista do Botafogo, frases que marcaram o futebol brasileiro. A mais famosa é: “Pênalti é uma coisa tão importante que quem deveria bater é o presidente do clube”. A política de dividendos, também um ato decisivo, deve reter a atenção do Conselho. Ela pode tanto impulsionar como prejudicar o desempenho das ações.
A literatura de finanças é controversa sobre o tema. Apresenta teorias que defendem que a política de dividendos afeta positivamente a cotação. Outras dizem ser ela indiferente para o desempenho do papel. Já tratei desse tema em post de setembro de 2011: “Faz sentido investir em ações com distribuição de dividendos elevada?”.
Fiquemos do lado das teorias que veem os dividendos como importante para o desempenho da ação. Mesmo assim, o destino da geração de caixa deve ser bem balanceado entre investimentos produtivos e dividendos. Se a empresa pender para o segundo em detrimento de gastos que podem fomentar seu crescimento, as ações sofrerão mais à frente. Por outro lado, investimentos ineficientes destroem valor. Nesse caso, o dinheiro nas mãos dos acionistas evitaria o estrago.
Dada a instabilidade de nossa economia, é comum vermos companhias com caixa elevado com montantes muito acima do necessário para cobrir suas necessidades de capital de giro, investimentos e amortização do endividamento. As altas taxas de juros praticadas no Brasil também incentivam a uma postura menos eficiente do uso do caixa.
Em meados da década passada, uma empresa do setor de telecomunicações chamava a atenção. Seu caixa era muito superior às suas necessidades. Alguns acionistas não se preocupavam, dizendo que o caixa da empresa era também deles, acionistas. Outros não eram tão benevolentes, acreditando que o dinheiro estaria mais “seguro” em suas mãos, receosos da possibilidade de práticas nebulosas dos administradores. Segundo minha avaliação, o dinheiro não era distribuído porque como o controle era detido com apenas 17% das ações, a maior parte dos recursos distribuídos iria para os minoritários. Isso combinado com a possibilidade de venda da companhia, sempre ventilada, tornava interessante manter caixa a fim de elevar o valor da companhia. A retenção de caixa era criticada pela maior parte do mercado, impedindo que as ações atingissem seu valor justo.
Recentemente, dois casos mostraram como a distribuição de resultados pode destravar valor. A Hypermarcas, que quando veio para a bolsa possuía atuação diversificada indo de alimentos a cosméticos e agora tem foco na indústria farmacéutica, reduziu seu capital social e distribuiu o caixa acumulado a seus acionistas. O valor de R$ 821 milhões representava 5% do valor de mercado da empresa. Os acionistas parecem ter gostado. Em março, HYPE3 sobe 6,6%, enquanto o Ibovespa cai 3,5%.
A redução de capital difere dos dividendos, pois esse é pontual e não recorrente ao passo que os dividendos são periódicos.
A Usiminas também se utilizou dessa estratégia para aumentar seu caixa e reduzir sua alavancagem. A empresa conseguiu aprovar em Assembleia Extraordinária a redução do capital de sua controlada Usiminas Mineração em R$ 1 bilhão, sendo que 70% do valor engordou o caixa da siderúrgica, suavizando seu nível de endividamento.
Algumas empresas sob a desculpa da prudência retém caixa além do necessário para suas atividades, diminuindo o valor da companhia. Na falta de um uso melhor, a distribuição de recursos ociosos seja por meio de dividendos ou redução de capital deve ser mandatória. Ninguém melhor do que o próprio acionista para saber o que fazer com o dinheiro. As empresas abertas deveriam ter isso em mente, pois a geração de valor pode estar dormindo placidamente no cofre da companhia.
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Oi André,
Ótimo texto
Quando você fala da redução de capital isso quer dizer a mesma coisa que recompra de ações?
Obrigado
Obrigado, Isaac.
Não, na recompra de ações, a empresa usa seu caixa para recomprar suas próprias ações no mercado. O dinheiro não vai para o acionista que continua na cia.
Já na redução do capital, o capital social é reduzido e o valor é destinado aos acionistas da empresa.
Concordo plenamente com esta publicação. A solução para não distribuir dividendos seria investir em ativos que no máximo possua o mesmo risco do investimento onde o acionista colocaria seu rico dinheiro, caso opta-se por receber os dividendos..
O caixa é da empresa e a empresa é do acionista. A habilidade da empresa em utilizar o capital é o que deve ditar o que deve ser feito. Se existem oportunidades de investimento que criem valor, que o dinheiro seja usado. Se a empresa é negociada abaixo do seu valor intrinseco, faz sentido uma recompra de ações. Fora isso, o dinheiro deve ser retornado ao acionista para melhor uso. Isso não é nenhum favor, mas boa gestão.
Infelizmente o que se ve são gestões incompetentes pagando alto por suas próprias ações e investindo em projetos destruidores de valor, contrariando o interesse dos acionistas. Quando um gestor toma decisões pensando muito em cotação de ação e em seus interesses pessoais e pouco no negócio propriamente dito, o melhor que um acionista pode fazer é procurar outro investimento.