As ações dos dois maiores bancos privados – Itaú Unibanco e Bradesco – negociam com desconto para os demais bancos latino-americanos apesar de apresentarem excelente rentabilidade. O blog já buscou explicações para essa distorção em artigo anterior. Recentemente, participei da 18ª Conferência Anual da empresa de avaliação de risco Moody’s. A apresentação feita na ocasião sobre os bancos locais pode trazer uma luz sobre o tema.
Em fevereiro último, no post “Os bancos brasileiros são um 7 a 1”, montei um gráfico que comparava o múltiplo P/L (preço por lucro) de Itaú Unibanco (ITUB4) e Bradesco (BBDC4) com os de alguns bancos da América Latina: o mexicano GF Norte, Banco do Chile, Bancolombia e o peruano Credicorp. Na ocasião, o desconto do múltiplo de Itaú Unibanco para esses bancos variava de 21% a 40%. O indicador de Bradesco era ainda mais depreciado, sendo inferior entre 32% e 48%. Tive o cuidado de ajustar os múltiplos dos bancos pelo risco país medido pelo “credit default swap”.
Dei duas possíveis razões para essa distorção: (i) o receio com o sistema financeiro europeu que estaria contaminando o preço dos papéis dos bancos brasileiros devido a maior liquidez dessas ações e (ii) a falta de perspectiva da economia brasileira em decorrência da desastrosa gestão econômica do governo de Dilma Rousseff.
Mas via uma possibilidade para a valorização dessas ações: “Mas governos são cíclicos e irão passar. Assim, caso não haja uma ruptura econômica na Europa, a troca de governo no Brasil pode ser um forte catalisador para as ações de Itaú e Bradesco. Fiquemos, portanto, de olho na agenda política”
O governo petista foi substituído e o discurso mais consistente da nova equipe econômica foi benéfico para as ações de Itaú e Bradesco. Os múltiplos P/L 2017 de ITUB4 e BBDC4 na última sexta, dia 7 de outubro, eram de 10,0 vezes e 9,4 vezes, respectivamente, bem superiores aos do post de fevereiro: 6,6 vezes e 5,7 vezes. Assim, como esperado, a troca de governo foi fundamental para a recuperação do preço das ações. Contudo, os múltiplos dos bancos brasileiros ainda permanecem inferiores aos dos bancos latinos, com exceção do Bancolombia com indicador de 8,92 vezes. Na última sexta, GF Norte tinha múltiplo P/L de 12,97 vezes, Banco do Chile 11,85 vezes e Credicorp 10,38 vezes.
O estudo “Sistema Bancário Brasileiro – Efeitos persistentes da recessão determinam perspectiva” apresentado na Conferência da Moody’s possuía um gráfico que ajuda a explicar o persistente desconto das ações os bancos brasileiros.
O gráfico apresenta a rentabilidade dos bancos calculada com a divisão do lucro líquido pelo total de ativos no eixo das ordenadas e a solvência medida pelo capital próprio sobre o ativo ajustado pelo risco no eixo das abscissas. Percebemos que os três principais bancos privados brasileiros apresentam excelente rentabilidade (o Santander “puxa” a média para baixo). O retorno é inferior apenas ao dos bancos sul-africanos (mesmo assim a diferença é imaterial), mas superior a rentabilidade das instituições dos demais países.
Por outro lado, embora a Moody’s afirme que a capitalização dos bancos locais é adequada, a medida de solvência dos Top 3 só é superior à dos bancos da Colômbia, do Chile e dos bancos públicos locais. Essa ótica ajuda, por exemplo, a explicar porque o Bancolombia e os bancos públicos têm hoje múltiplos inferiores aos de Itaú e Bradesco, enquanto os demais possuem índices superiores. Mesmo os criticados bancos italianos possuem solvência maior – 11,4% versus 8,6% dos Top 3.
Como explicado na Conferência, o cálculo do capital regulatório feito pelo Bacen é diferente do realizado pela Moody’s. A empresa de rating utiliza abordagens distintas para o crédito tributário e os títulos públicos. Mas, mesmo assim, a diferença entre o índice de solvência dos bancos pátrios e o dos bancos estrangeiros chama a atenção. Apesar da boa rentabilidade de Itaú Unibanco e de Bradesco, seus múltiplos P/L são inferiores aos da maioria dos bancos latinos. A menor capitalização pode ser a explicação. Intuitivamente, o mercado adota uma abordagem de risco e retorno. Se isso é verdade para os dois principais bancos privados, vale ainda mais para o Banco do Brasil (BBAS3). Seu múltiplo P/L para 2017 é bem depreciado (6,73 vezes), vítima da menor capitalização e também da rentabilidade inferior.
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Parabéns pela análise fundamentada assim como pelo tema abordado.
Bancos são realmente o melhore negócio e gosto de acompanhar as cotações dos 2 maiores e do BBAS3/BBSE3. Vão bem em qq situação, vacas magras ou gordas, recessão ou crescimento econômico não importa pois sempre apresentam lucro líquido bilionário. E não é de hoje.
Gostaria de indagar o brilhante articulista e financista se sabe o motivo para o fato concreto de que desde o final de 2011 o papel BBDC3(ON) quebrou uma relação de inferioridade de valor natural ( uma vez que remunera 10% a menos que BBDC4 ) para ser cotado em alguns pregões ( de 2011 até maio/junho) até em valor 10% superior à própria PN.
Mesmo agora há um gap de somente 3% pró BBDC4.
V saberia dizer o por que?
Sim, sei que BBDC3 passou a fazer parte da carteira MSCI à ocasião mas ainda assim o fato de remunerar a menor(10%) me intriga.
Abraço
Perdão, o último parágrafo ficou sem sentido. Na verdade o que me intriga não é o fato de remunerar a menor já que isto é estabelecido no Estatuto do Banco mas o por que de ter ocorrido essa inversão de relação histórica.
Abraço.
Oi Afonso
Podemos fazer apenas algumas suposições. Tem ocorrido algumas alterações societárias em empresas que detêm o controle do banco. Investidores com isso podem estar preferindo se posicionar nas ações detidas pelos controladores – as ONs – para ficarem alinhados a eles apesar de possuírem um dividendo por ação inferior.
Pode ser uma troca de um direito econômico (o dividendo) pelo direito político (o voto).
Abraço
Andre Rocha