Como as varejistas têm se saído na crise?

Inflação alta, juros elevados, redução da renda disponível, PIB em queda e crescimento do desemprego. As variáveis macroeconômicas não têm contribuído para o bom desempenho das empresas ligadas ao varejo de moda. Apesar do cenário recessivo, algumas companhias têm obtido resultados satisfatórios. Analisei as ações de Arezzo  (ARZZ3), Grendene (GRND3), Lojas Renner (LREN3), Marisa (AMAR3), Guararapes (GUAR3) e Hering (HGTX3).

As ações das empresas ligadas ao mercado doméstico eram a opção preferida dos investidores nos últimos anos em decorrência do cenário macroeconômico benévolo: inflação controlada, juros baixos, queda do desemprego e elevação da renda. Contudo, a situação se reverteu acentuadamente nos últimos 18 meses. Logo, foi natural que os investidores passassem a mostrar receio de continuarem posicionados nessas ações.

O sentimento para o setor é negativo. Reportagens têm destacado o aumento do estoque das varejistas. Em um cenário recessivo, a administração de estoques deve ser acompanhada de perto. A produção deve acompanhar o ritmo das vendas a fim de evitar o acúmulo de estoque, o que pode drenar o capital de giro, alocando recursos em um ativo ocioso. E com Selic a 14,25% ao ano, buscar recursos no mercado pode ser fatal.

Das empresas listadas em bolsa analisadas, apenas Grendene e Hering apresentaram crescimento do prazo médio de estoque comparando-se os 12 meses encerrados em setembro de 2015 com o mesmo período de 2014.

apesar da crise

O crescimento do prazo nas duas empresas ficou ao redor de 14%. Marisa e Guararapes tiveram crescimentos modestos na duração do estoque, enquanto Arezzo e Lojas Renner, queda no indicador.

O diretor da Grendene na teleconferência de resultados informou que houve uma antecipação da produção referente ao quarto trimestre, o que explicaria o aumento do número de dias do estoque em setembro. Logo, no geral, não se pode dizer que as empresas estejam excessivamente estocadas.

Um erro cometido em certas análises é comparar a conta de estoques de 2015 com a de 2014. Como na maior parte das empresas, com exceção de Marisa, houve acréscimo na conta, alguns agentes falaram apressadamente que as empresas estavam superestocadas. Mas como a maior parte das empresas apresentou incremento das vendas entre os 12 meses encerrados em setembro de 2015 na comparação com o mesmo período de 2014, os estoques aumentarem era uma conclusão natural.

Das seis empresas, quatro apresentaram incremento da receita no período: Lojas Renner (18,9%), Guararapes (18,2%), Arezzo (10,3%) e Grendene (3,4%). Marisa teve receita praticamente estável (-0,4%) e apenas Hering apresentou decréscimo de 5,9% no faturamento. Logo, o correto é observar o prazo médio dos estoques e não simplesmente olhar a conta de estoques localizada no ativo.

É verdade que muitas vezes a redução de estoques se dá com a concessão de descontos, o que reduz as margens. Contudo, tendo em vista o cenário desafiador, pode-se dizer que as empresas estão sabendo administrar com sapiência seus estoques.

Além disso, o retorno sobre o patrimônio tem se mantido elevado apesar da queda em comparação a um ano atrás, em decorrência principalmente dos descontos e da inflação de custos: Lojas Renner (28,4% em setembro/15 versus 31,4% em setembro de 2014), Arezzo (20,1% em setembro/15 versus 22% em setembro de 2014) e Hering (27,9% em setembro/15 versus 32,6% em setembro de 2014). Grendene fez ainda melhor aumentando a rentabilidade no período de 20,7% para 23,2%, beneficiando-se da melhora do retorno de suas exportações. Apenas Marisa teve retorno negativo de 0,8% e Guararapes, redução acentuada do retorno no período de 17,3% para 12,3%.

Apesar dos números em geral satisfatórios, as ações do setor não têm tido bom desempenho nos últimos 12 meses. Apenas os papéis de Renner e de Grendene tiveram valorização, de 29,4% e 5,6%, respectivamente. O comportamento dos investidores pode estar contaminado pelo sentimento negativo em relação ao setor. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), a queda no varejo no país deve ser de 5% em 2015. Contudo, como comentado acima, as varejistas listadas têm apresentado, em regra, crescimento do faturamento e retornos atraentes.

A queda de 50,8% das ações de Marisa pode estar relacionada ao retorno pífio e à estabilidade da receita. Já o declínio de 44% de Guararapes pode refletir o decréscimo do retorno sobre o patrimônio e o prazo médio elevado dos estoques de 156 dias, bem superior ao das concorrentes. Já a depreciação de 17% das ações de Arezzo pode estar mais afeita ao sentimento negativo em relação ao setor. No caso de Hering, o resultado pode não ter sido brilhante, mas justifica uma queda de 33% das ações em 12 meses? O retorno sobre o patrimônio em setembro de 2015 chegou a 27,9%.

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2 Comentários

  1. André, excelente texto, como sempre!
    Gostaria de saber se há um ponto adicional na sua análise…
    Sabemos que alguns varejistas, tanto aqui quanto lá fora, tem forte atuação na concessão de créditos aos seus clientes, tanto em compras parceladas como via cartões de marca própria. Também sabemos que a inadimplência das pessoas físicas aqui no Brasil tem subido, pelas mesmas questões conjunturais explicitadas em seu texto (aumento do desemprego, inflação alta, etc.). Estas variáveis podem estar por trás da precificação das ações de varejistas, em sua opinião? Até que ponto?
    Abraços!

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