Por que as “small caps” seduzem o mercado?

“Small caps” são empresas de menor porte. São companhias com pequeno valor de mercado, com baixa capitalização. Mas não existe um conceito único para classificar essas companhias. O analista deve se atentar para o tamanho da receita, o volume financeiro das ações negociado diariamente ou o valor de mercado da companhia? E por que as “small caps” atraem tanto a atenção do mercado?

Estudos acadêmicos, especialmente nos Estados Unidos, indicam que ações de menor porte apresentam retorno no médio prazo superior ao dos papéis de empresas maiores. O preço de uma ação é formado quando a oferta de compra e a de venda dos investidores se encontram. Enquanto as ofertas não se cruzam, o preço da ação não se materializa. Em regra, ações de menor capitalização apresentam diferença (“spread”) maior entre essas ofertas devido à menor negociabilidade. Assim, em 1989, Yakov Amihud and Haim Mendelson, professores da Stern School of Business, da New York University, examinaram a relação entre o “spread” das ofertas e o retorno das ações. Eles concluíram, com base no estudo das ações da NYSE entre 1961 e 1980, que um aumento de 1% no “spread” (como percentagem do preço da ação) aumentava a expectativa de retorno anual em 0,24% a 0,26%.

Outros estudos mostraram que o volume médio diário negociado comparado ao valor de mercado (“turnover ratio”) e o retorno são negativamente correlacionados, ou seja, quando a liquidez é menor (logo menor “turnoverratio”), a rentabilidade da ação tende a ser maior e vice-versa. Essas análises tentaram separar outras variáveis que poderiam afetar a comparação. Assim, Vinay Datar, Narayan Naik e Robert Radcliffe buscaram comparar empresas com níveis semelhantes de “valuation” com base no múltiplo preço por valor patrimonial. Concluíram que ações mais ilíquidas tiveram retorno anual 3,25% superior ao das ações mais líquidas e a cada 1% de aumento do “turnover ratio”, o retorno anual se reduzia em 0,54%.

Dessa forma, não é de se espantar que gestores busquem se afirmar como especialistas em “small caps” e que a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) tenha reservado uma categoria na sua classificação de fundos de investimentos para contemplar essa classe de ativos.

Mas definir o que é uma “small cap” não é tarefa fácil. Alguns observam a liquidez diária. Logo, ações com negociação inferior a R$ 5 milhões diários seriam “small caps”. Outros olham o tamanho do valor de mercado da empresa. O artigo 16 da Lei 13.043 de 2014 — que trata, entre outros assuntos, da isenção de imposto sobre a renda na alienação de ações de empresas pequenas e médias — dá sua contribuição para a definição do conceito de “small caps” com base na capitalização. Para a lei, “small caps” são as empresas com valor de mercado (total de ações multiplicado pela cotação) inferior a R$ 700 milhões na data da oferta pública inicial e com receita bruta anual inferior a R$ 500 milhões.

Já para a Anbima, um fundo para ser classificado como “small caps” deve investir, no mínimo, 85% em ações de empresas que não estejam incluídas entre as 25 maiores participações do IBrX – Índice Brasil. Os 15% remanescentes podem ser investidos em ações de maior liquidez ou capitalização de mercado, desde que não estejam incluídas entre as dez maiores participações do IBrX – Índice Brasil.

Percebe-se que a associação é mais benevolente no conceito de “small caps”. Para ela, a carteira de ações desse tipo de fundo poderia aplicar até o limite de 15%, por exemplo,  em ações do Banco do Brasil (BBAS3), Cemig (CMIG4), Fibria (FIBR3), Vale (VALE3), Pão de Açúcar (PCAR4) e Vivo (VIVT4), classificadas entre a 10ª e a 25ª   posições. E mesmo após a 25ª posição existem gigantes como a siderúrgica Gerdau (GGBR4) e a varejista Lojas Americanas (LAME4). Ironicamente esse fundo “small caps” poderia ter uma exposição elevada na mineradora Vale via aplicação na controladora Bradespar (BRAP4), que se encontra na 63ª posição no IBrX (carteira válida em 15 de maio).

A BM&FBovespa também possui seu Índice Small Cap (SMLL), formado pelas empresas que, em conjunto, não estejam entre os primeiros 85% do valor de mercado total da Bolsa.

Em horizontes mais curtos, a aplicação em “small caps” pode não funcionar devido à aversão ao risco por parte dos investidores, o que parece ter sido o caso nos últimos anos. Mas essa tática tende a gerar um retorno adicional no longo prazo em decorrência da assimetria de informações dessas empresas, que só pode ser superada com análises mais aprofundadas, inviáveis para a maioria dos investidores. Trabalhei em uma gestora no final da década de 90 que teve o segundo fundo de ações mais rentável da indústria com base nessa estratégia, ratificando as conclusões dos estudos citados no início do texto.

O investidor deve ter ao menos três cuidados ao se aventurar em “small caps”: ter certeza de que os recursos investidos não serão necessários no médio prazo, certificar-se se de que a alocação está sendo feita em verdadeiras “small caps” e confiar na capacidade do gestor.

 

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2 Comentários

  1. Olá André parabéns pelo texto,apenas uma dúvida, essa parte está escrita corretamente?
    Concluíram que ações mais ilíquidas tiveram retorno anual 3,25% superior ao das ações mais líquidas e a cada 1% de aumento do “turnover ratio”, o retorno anual se reduzia em 0,54%.

  2. Sim, porque o “turnover ratio” é uma medida de da liquidez. Logo se o montante negociado diariamente em relação ao valor de mercado aumenta, a liquidez também.
    Como as ações mais líquidas no médio prazo tendem a apresentar menor retorno, um incremento do indicador sinaliza uma queda da rentabilidade.
    Abraço

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