Nas últimas semanas, os maus resultados operacionais da Eletrobras sinalizaram para uma possível redução dos seus proventos, mesmo com os dividendos mínimos das ações preferenciais. O fato indica o cuidado que o investidor deve ter quando investe de olho apenas nos dividendos, bem como quando aplica em ações de estatais.
O economista Eduardo Giannetti da Fonseca fez uma observação interessante sobre o desempenho financeiro da Eletrobras e o da Petrobras no artigo “Política econômica companheira: deu tudo errado”, publicado na edição de 11 de julho de 2014 do jornal Folha de S. Paulo. Apesar do viés desenvolvimentista e estatizante do governo petista, as políticas adotadas nas duas estatais deprimiram seus valores patrimoniais e tolheram a capacidade de investimento. Na Eletrobras, destaque para a aceitação das regras para renovação das concessões visando à redução das tarifas elétricas para o consumidor. Já a Petrobras sofreu com a manutenção do preço dos derivados de petróleo, que levou a um descasamento entre o preço interno e o importado, bem como com o escândalo do pagamento de propinas a funcionários e políticos.
Mas a ingerência sobre as estatais não se restringe ao governo do PT. Como mostrei em artigo post, em julgamento sobre a incorporação da Petroquisa pela Petrobras no STJ (Superior Tribunal de Justiça), o acórdão demonstrava que os resultados das estatais não obedecem apenas a lógica do lucro: “Todos os que adquirem ações de uma empresa estatal são conhecedores de que essas empresas cumprem papel estratégico para o Estado. (…) Então, uma sociedade de economia mista tem, acima do lucro e dos interesses dos seus investidores privados, o interesse do Estado. O Estado pode, por razões estratégicas e com amparo legal, adotar decisões bem diferentes daquelas que um acionista privado faria.”
Assim, a Eletrobras, ao aderir à Medida Provisória 579, que antecipou a renovação das concessões de energia mediante a redução do preço das tarifas e baixa de ativos aderindo à política tarifária do governo, apresentou prejuízo de R$ 6,9 bilhões em 2012, de R$ 6,3 bilhões em 2013 e de R$ 1,857 bilhão até setembro de 2014. Apesar dos prejuízos acumulados, a empresa avançou sobre as reservas estatutárias para pagamento dos dividendos mínimos das ações preferenciais classe A (8% do capital próprio) e B (6% do capital próprio) em 2012 e 2013.
Nos dois últimos exercícios, a empresa pagou dividendos para todas as classes de R$ 867,9 bilhões em cada ano utilizando-se dessa reserva. Com isso, essa conta praticamente se exauriu, alcançando apenas R$ 2,1 bilhões em setembro de 2014, faltando ainda absorver o prejuízo do exercício de R$ 1,8 bilhão. Com isso, a não ser que a empresa apresente lucro significativo no quarto trimestre para compensar o prejuízo acumulado dos três primeiros, a empresa não conseguirá arcar nem mesmo com os dividendos mínimos das preferenciais.
O acionista minoritário Roberto de Moura Campos questionou a empresa, dizendo que o pagamento dos dividendos do exercício poderia ser apenas adiado para exercícios futuros e não deixado de serem pagos. Essa hipótese estaria correta se esses dividendos fossem cumulativos, mas não encontrei menção no estatuto social de que esses dividendos sejam cumulativos, ou seja, caso o resultado do ano em curso não possibilite o pagamento, o acionista ganha um crédito que deverá ser quitado em anos posteriores com os resultados desses anos. Assim, no caso da Eletrobras, o direito aos dividendos mínimos morre não havendo lucro nem reserva no exercício para satisfazê-los. Não satisfeito com resultados tão precários, a empresa ainda estuda investir em uma hidrelétrica na Nicarágua.
Alguns investidores baseiam sua decisão de investimentos com base apenas no retorno com dividendos (“dividend yield”). Imagine a decepção com essas notícias. O investidor nunca deve se esquecer de que o retorno com ações contempla o ganho ou perda de capital (preço de venda menos preço de aquisição) e o “dividend yield”. Com resultados operacionais catastróficos, não é de se admirar a queda de 32,4% de ELET6 [Eletrobras PNB] até 5 de dezembro de 2014, bem pior do que o desempenho do Ibovespa, positivo em 0,9% no mesmo período.
Outro equívoco é considerar o múltiplo P/VPA (preço por valor patrimonial) da Eletrobras atrativo somente porque ele está abaixo de 1 vez, ou seja, as ações da empresa estão negociando abaixo do valor patrimonial. O indicador está em 0,16 vez. Mas o investidor deve se atentar que esse baixo múltiplo apenas reflete a má performance operacional da companhia.
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André,
Faltou comentar algo importante no artigo. Os detentores de ações preferenciais com direito a dividendo fixo ou mínimo, de acordo com a Lei das SA, adquirirão direito de voto caso tais dividendos não sejam distribuídos pelo prazo fixado no estatuto, prazo esse limitado a três exercícios sociais consecutivos. Se o estatuto for omisso, porém, o direito de voto aparecerá logo no primeiro ano em que não forem pagos os dividendos fixos ou mínimos.
Só que a ELET é OMISSA no Estatuto. Então se não pagam, em tese, preferencialistas ganham direito a voto. É isso mesmo ?
Excelente lembrança Andre, mas o prazo para ganhar direito de voto seria o de três anos sem pagamento dividendos.
Esse direito está incluso no artigo 111 parágrafo 1º “As ações preferenciais sem direito de voto adquirirão o exercício desse direito se a companhia, pelo prazo previsto no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios consecutivos, deixar de pagar os dividendos fixos ou mínimos a que fizerem jus, direito que conservarão até o pagamento, se tais dividendos não forem cumulativos, ou até que sejam pagos os cumulativos em atraso.”.
Como o estatuto é omisso, vale o prazo de três anos.
Abraço, André
Prezado Estrategista,
Pela leitura que fiz das decisões da CVM sobre o tema, me parece que ficou assentado o entendimento naquela entidade de que, no caso de não pagamento do dividendo mínimo aos preferencialistas, o direito ao voto dar-se-á automaticamente, em linha com o voto da Profa Norma Parente, no caso emblemático da Plascar (CVM n. RJ 2002/2941):
“O direito de participar dos lucros sociais tem caráter periódico (anual). Assim, a cada ano em que não se pagam os dividendos, está se impedindo um direito essencial do acionista. A contrapartida para essa obstrução só pode se o direito de votar para tentar sustar a infração continuada.”
Na mesma linha a doutrina:
AQUISIÇÃO IMEDIATA DO DIREITO NA OMISSÃO DO ESTATUTO
“Se o estatuto for omisso, o acionista [preferencialista] adquire o direito de voto IMEDIATO. Não há, com efeito, nenhum fundamento para que se entenda o preceito supletivo da lei como de tolerância. Dessa forma, o prazo de três anos aventado no diploma legal é o máximo que o estatuto poderá estabelecer para a aquisição do direito. Se não o fizer nesse prazo ou em menor, entende-se que se adquire o direito de voto a partir do seu fato gerador, no PRÓPRIO EXERCÍCIO em que se verificou”.
(CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, São Paulo)
Você já viu algum caso parecido em seus 15 anos de mercado ?
Andre,
Lembro-me do caso da Vivo, mas não eram ações preferenciais com dividendos mínimos.
Tanto a Norma Parente como o Modesto Carvalhosa são estudiosos que seguem uma linha mais voltada para os minoritários. Não sei se a atual composição da Diretoria da CVM teria esse entendimento.
Abraço
André Rocha
A Eletrobrás não prevê em seu estatuto dividendos fixos ou mínimos, apenas dividendos prioritários, não ensejando assim a aplicação do artigo 111 parágrafo 1º em hipótese alguma.
O Caso é bastante similar ao caso da Bombril. http://www.cvm.gov.br/port/descol/respdecis.asp?File=4879-0.HTM
Esse governo não respeita os acionistas das empresas estatais abertas. Quando precisaram captar recursos, emitiram ADRs no exterior, buscando os recursos dos Fundos de Pensão externos, principalmente os americanos. A gestão da Eletrobras é temerária, com custos excessivos, em completo desrespeito aos acionistas privados. Se já tinham a intenção de prejudicar os acionistas da Companhia, que não captassem recursos nos mercados. O mesmo se aplica à Petrobrás, que captou recursos do FGTS incentivada pelo próprio Governo. A CVM deveria intervir no processo e exigir respeito às regras de mercado, a exemplo do que está fazendo a SEC e os acionistas privados externos. O que vem acontecendo no mercado de ações brasileiro, primeiro com as empresas de Eike Batista (X), depois com as estatais, faz com que a credibilidade do mercado de ações brasileiro inexista. Assim, jamais seremos um país respeitado, pois o desrespeito parte de quem governa e isso é exemplo para toda a nação, do Presidente ao mais humilde dos trabalhadores. Eles brincam com o dinheiro do contribuinte, expropriam as empresas estatais, emprestam dinheiro a quem jamais devolverá, constroem portos em Cuba, hidroelétricas na Nicarágua, tudo com o dinheiro do BNDES, e nada acontece. O aparelhamento das instituições faz com que o país seja governado apenas para quem obedece ao rei. Os políticos brasileiros, em regra geral, querem manter o status quo e não fazem nenhuma questão de mudar nada, nem a própria oposição o faz. Tudo é de mentirinha. Tudo é teatro. O candidato Aécio Neves convoca o povo para ir às ruas protestar contra o governo e a corrupção e, enquanto o povo (meia dúzia de gatos pingados) foi à rua em S.Paulo, ele estava em Santa Catarina nadando nas águas claras das praias catarinenses. Esse não é o papel de um Líder. Ele, tendo convocado o povo a sair para as ruas, deveria estar junto, liderando o protesto e não tirando férias em praias catarinenses. Mude Aécio, seja o líder que metade da população brasileira quer e precisa. Nunca mais convoque o povo para um evento que você não pretende ir. Se o fizer, vá junto, lidere, proteste e faça acontecer.
Investidores estrangeiros estão otimistas com a Eletrobras.
Como podemos observar no relatório de atividades da empresa, na estrutura de capital, de 2012 e do 3T2014, as ações da Eletrobras disponíveis no mercado mudaram de mãos. Em 2012, os investidores brasileiros (residentes) eram detentores de 6,3% das ações ordinárias e 46,5% das ações preferenciais, equivalentes a 14,2% do capital total. Por outro lado, os investidores estrangeiros (não-residentes) possuíam 14,1% das ações ordinárias e 36,1% das ações preferenciais, correspondentes a 18,4% do capital total.
Verificamos que, no final do terceiro trimestre de 2014, os investidores brasileiros perderam participação no capital da Eletrobras, de 6,3% para 6,0% das ações ordinárias, de 46,5% para 40,7% das ações preferenciais e de 14,2% para 12,7% no capital total. Enquanto isso, os investidores estrangeiros (não-residentes) aumentaram a sua participação de 14,1% para 17,1% das ações ordinárias, de 36,1% para 42,1% das ações preferenciais e de 18,4% para 22,0% no capital total.
Logo, constatamos que os investidores estrangeiros estão otimistas, comprando as ações da Eletrobras e os investidores brasileiros estão pessimistas, vendendo as ações da empresa.
De fato, a Eletrobras é uma empresa ser bem capitalizada, com capital social de R$ 31,3 bilhões e reservas de capital de R$ 26 bilhões. Em 30.09.2014, em caixa e em títulos e valores mobiliários detinha R$ 10,1 bilhões, enquanto que o seu valor de mercado (número de ações total x cotação) era de apenas R$ 7,3 bilhões.
A Eletrobras é um gigante que possui um parque gerador de energia elétrica com capacidade instalada de 43 GW, incluindo metade da potência da usina Itaipu pertencente ao Brasil, correspondentes a 34% do total nacional. A empresa também é proprietária de 50% das linhas de transmissão do país e está investindo fortemente em novos projetos de geração de energia.
A Eletrobras vai acrescentar à geração do País mais 13 gigawatts entre 2014 e 2018, destacando a construção de usinas hidrelétricas no rio Madeira e de usinas eólicas nos extremos nordeste e sul do Brasil. O orçamento de investimentos de 2014 é de R$ 14,1 bilhões. Nas demonstrações financeiras, os valores investidos estão representados como despesas, que causam redução do lucro e da geração de caixa da empresa.
Fonte: http://www.eletrobras.com/…/d…/Pages/LUMISB90F1B6DPTBRIE.htm
Link correto:
http://www.eletrobras.com/elb/ri/data/Pages/LUMISB90F1B6DPTBRIE.htm