A força da conjuntura nos investimentos

Nos últimos meses, houve forte fluxo financeiro para o mercado brasileiro. A postergação do aumento dos juros com a continuação da política monetária acomodatícia nos Estados Unidos, bem como pesquisas eleitorais favoráveis aos candidatos de oposição, fez com que investimentos como bolsa e títulos públicos se valorizassem e o dólar enfraquecesse. Como o investidor deve encarar essa mudança de humor do mercado? Qual estratégia utilizar: “surfar” o ganho de curto prazo ou possuir uma carteira que, embora não tão rentável no momento, apresente melhores perspectivas no médio prazo?

Uma das técnicas utilizadas na avaliação de ações é a análise fundamentalista. Ela se divide em duas correntes: (i) a “top down” na qual o investidor escolhe as ações de empresas que tendem a se beneficiar do cenário macroeconômico projetado ou (ii) a “bottom up”, cujo enfoque é sobre a companhia analisada. No primeiro caso, a conjuntura ganha destaque, enquanto na segunda abordagem ela apresenta papel secundário.

O gestor, que teve uma abordagem “top down” nos últimos meses, teve um desempenho superior ao fundamentalista “bottom up”. Por exemplo, a divulgação de pesquisas mostrando a fragilidade da candidatura de Dilma Rousseff foi a senha para a valorização de empresas estatais como Petrobras (PETR4) e Eletrobras (ELET6). A simples possibilidade de que o próximo presidente tenha uma postura menos intervencionista na economia animou os investidores para investimentos de maior risco como a bolsa. Alguns podem alegar que apostas nas estatais são resultado de pura especulação, mas não é verdade. Uma nova política econômica tende a ser benéfica a essas empresas, aumentando seus lucros. Além disso, a queda acentuada do preço das ações da Petrobras nos últimos anos teve como reflexo o aumento do retorno com dividendos, o “dividend yield” (dividendo por ação dividido pela cotação). Esse raciocínio tem base na análise fundamentalista. Não se pode dizer que quem apostou nas estatais apenas especulou.

Contudo, a estratégia “bottom up” é mais vitoriosa no longo prazo. Investidores como Philip Fisher e Warren Buffet t não construíram seus prestígios projetando cenários macroeconômicos, mas, sim, estudando a fundo as empresas e seus setores de atuação.

Sou contra radicalismos. Sou adepto da filosofia de Aristóteles: “a virtude está no meio”. Assim, construir uma carteira com 70%-80% das escolhas calcadas na análise “bottom up”, deixando o restante para apostas com base na tendência macroeconômica ou em eventos societários (fechamento de capital, troca de controle, direito de recesso, incorporações, etc.) pode ser um caminho interessante. É uma tentativa de conciliar a estratégia de longo prazo sem se esquecer das nuances momentâneas do mercado.

Tratei do mercado acionário, mas essa estratégia vale também para a renda fixa. Imagine um investidor que tenha comprado o título NTN-B com vencimento em 2035 que rende IPCA mais 5,5% de juros ao ano, visando sua aposentadoria. Com o aumento da taxa Selic para 11%, os juros reais aumentaram para cerca de 6% a.a.. Com isso, o preço do papel comprado pelo investidor caiu e ele teria prejuízo caso o vendesse agora. Motivo para preoupação? Nem tanto. Caso ele mantenha o título até o vencimento, terá garantido inflação mais juros reais de 5,5%. Nada mal. Essa compra foi baseada no longo prazo e a estratégia permanece válida a despeito do cenário de curto prazo. Isso não significa que todo o investimento dele deveria estar alocado em NTN-B 2035. Outra parcela poderia estar alocada em papéis que respondessem a alta da Selic como LFT ou CDB de bancos. Dessa forma, ele teria uma carteira diversificada com títulos que atendessem a diversos horizontes de investimentos.

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2 Comentários

  1. Obrigado Edir.

    Não acredito na manipulação da Selic. O Brasil tem avançado no arcabouço institucional, embora ainda apresente falhas. O problema reside no fato de que a inflação da classe A da população brasileira tem superado o IPCA devido a forte concentração em serviços – escolas, comida fora, viagens, etc. Se essa tendência persistir, o IPCA cobrirá apenas parte da inflação dessa parcela da população.

    Abraço

    André Rocha

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