Alguns economistas acreditam que a liquidez abundante e os juros baixos patrocinados pelos bancos centrais têm gerado uma bolha na qual o preço dos ativos passam a não refletir seus fundamentos econômicos. Embora essa tese não possa ser descartada, há indicadores que afastam essa conclusão.
Um leitor fez um interessante raciocínio. Com o crédito farto dos últimos anos, seria interessante fazer uma ligação entre a teoria austríaca dos ciclos econômicos e a bolsa. Em resumo, essa escola defende que a abundância de crédito a juros baixos eleva a oferta monetária, incentivando os agentes a procurarem ativos de maior risco. Mas como boa parte desses investimentos não traz resultados, ocorre uma crise creditícia, seguida de recessão. Segundo o leitor, dominando-se essa teoria, o investidor estaria mais preparado para a escolha das ações.
Essa estratégia tem alguns inconvenientes. Primeiro, a teoria não prediz exatamente quando a derrocada irá ocorrer. Além disso, ela parte da tática “top-down”, ou seja, a decisão de aplicar na bolsa parte da análise macroeconômica e somente após se delinear o contexto global o investidor faz a escolha dos papéis. Contudo, os investidores fundamentalistas de maior prestígio adotam outra postura – a análise “bottom-up” – onde se escolhem as companhias tomando por base seus resultados operacionais com a análise macroeconômica ficando em segundo plano.
Apesar dessas considerações, o medo de que estejamos perto de uma crise não é exclusivo do leitor. A reportagem, “Boom de emissões de dívida e ações gera riscos ao mercado”, do Wall Street Journal, publicada no Valor Econômico de 11 de novembro de 2013, mostra que o volume financeiro em ofertas iniciais de ações nos EUA alcançou US$ 51 bilhões nos primeiros dez meses de 2013, maior soma desde 2000, ano do estouro da bolha das companhias de internet. Já as ofertas secundárias foram de US$ 155 bilhões no mesmo período, maior volume desde 1995 quando a consultoria Dealogic começou a compilar os dados. Jay Ritter, professor de finanças da Universidade da Flórida, concorda que o mercado está aquecido, mas não se mostra preocupado porque a onda de aberturas de capital tem se concentrado no setor de biotecnologia e não tem havido a listagem de empresas marginais.
Os analistas parecem se esquecer de um fato importante. O fim da flexibilização da política monetária americana é por uma boa causa: a normalização da atividade econômica nos EUA. Se observarmos o múltiplo P/L (preço por lucro) do índice acionário S&P 500 nos últimos cinco anos, ele se encontra próximo da sua máxima no período – 15,3 vezes versus 16,4 vezes em outubro de 2009. Mas isso não é um resultado normal tendo em vista os diversos solavancos que a economia mundial sofreu nos últimos anos como a crise bancária europeia e o rebaixamento do “rating” norte americano em agosto de 2011? Se os EUA caminham para uma economia mais estável não é natural que o índice espelhe essa situação?
Já se olharmos o múltiplo da bolsa brasileira, veremos que ele ainda se encontra longe da máxima dos últimos cinco anos: 13,7 vezes em janeiro de 2010. Em 18 de novembro de 2013, o índice estava em 11,1 vezes.
Assim, a bolsa teria que se apreciar mais 22% para atingir a máxima, caso o lucro projetado permaneça constante. Considerando que o Ibovespa é concentrado em empresas de commodities e instituições financeiras, será que em um mundo mais normal não há espaço para que as ações dessas empresas apresentem melhor desempenho do que o verificado nos últimos anos? Um indicador superior à média do período deve causar desconforto?
Com todo respeito:
Cometeu os seguintes erros clássicos: (i) confundir má alocação de recursos na economia com a magnitude dos fundamentos das empresas; (ii) Achar que existe uma dicotomia entre análise austríaca de ciclos e análise fundamentalista; e (iii) se basear numa visão retrospectiva de indicadores e ao mesmo tempo exigir que a teoria austríaca tenha capacidade de prever quebras (cisnes negros são imprevisíveis).
Sugiro um maior aprofundamento sobre a Teoria Austríaca dos Ciclos econômicos. Recomendo a leitura do Ação Humana de Ludwig Von Mises e do livro Moeda, Crédito Bancário e Ciclos Econômicos de Jesus Huerta de Soto (http://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=65). De quebra sugiro a leitura do livro do Nassim Taleb, chamado Antifragile.
abçs
Caro Tullio
Não exigi que a teoria tivesse a capacidade de prever quebras. Basta ler mais atentamente o texto: “Primeiro, a teoria não prediz exatamente quando a derrocada irá ocorrer.”
Ao analisar a conjuntura macroeconômica, a teoria austríaca se aproxima de uma análise fundamentalista “top-down”.
O post não pretende analisar em exaustão a teoria austríaca (até porque não há espaço suficiente, são apenas cerca de 3 mil caracteres), mas apenas pegar pontos que se aproximem da análise fundamentalista.
Quanto as sugestões de leitura estão anotadas.
Abraço
André Rocha
Tive esta mesma impressão. Se a questão da “escola austríaca não prever quando a derrocada irá acontecer” for idéia do leitor, é melhor colocá-la entre aspas porque a leitura do texto sugere uma afirmação do autor do blog. Não se trata de vidência e sim de evidências…
Tullio,
Com todo o respeito, parece que vc não leu o texto com atenção. Gostaria de comentar seus pontos:
(i) Não houve confusão. Houve um reconhecimento de que a análise fundamentalista mais premiada (Bill Ackman, W.Buffet, Munger, Howard Marks, Seth Klarman e por aí vai) se baseia primeiramente em fundamentos das empresas (bottom up). É claro que eles não deixam de olhar a macroeconomia, mas como está escrito, este é um aspecto secundário na consideração de um investimento.
(ii) O texto se propõe a relacionar conjuntamente a análise austríaca a indicadores fundamentalistas, que segundo o André, não parecem justificar uma bolha. Logo, não há nenhuma dicotomia.
(ii) “(iii) se basear numa visão retrospectiva de indicadores” –> Gostaria de saber a sua maneira de tentar enxergar o futuro, sem algum olhar retrospectivo. Se souber, ficará rico.
Abs
Caro André
Parabéns pelos seus artigos e compartilhamentos da sua experiência no mercado de ações.
O que você citou como resumo da Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos realmente é impreciso. A inflação no valor dos papéis causada pela criação de dinheiro pelos BCs e pelos multiplicadores bancários também pode ser concluída por outras escolas de pensamento e é apenas uma faceta das predições da Teoria Austríaca.
Para os Austríacos o guia dos empresários e demais agentes econômicos são os preços, que precisam de um mercado desimpedido para não fornecerem falsas pistas. Algo importante a ser precificado é a taxa de juros que diz aos agentes se projetos mais longos são viáveis ou não e a quantidade de poupança(bens de capital, tecnologia etc) disponível para produção futura(na verdade fornece mais uma infinidade de informações). A intervenção dos Bancos Centrais e a expansão do crédito pelos bancos distorce a taxa de juros e a partir daí agentes passam a cometer erros de forma generalizada. Resumi o possível e omiti muita coisa importante, mas dessa forma fica mais claro porque a preocupação com a situação econômica por parte dos austríacos. Apesar de longo esse vídeo do prof Huerta de Soto vale cada segundo http://www.youtube.com/watch?v=Xz0NOE2H3Ig.
Você está certo em dizer que essa teoria é incapaz de dizer quando e como, também quanto a possibilidade de vermos mais bull market pela frente, mas depois de conhecer a teoria e compará-la com crises anteriores vai perceber que ela ainda pode ser muito útil a qualquer investidor.
Abraço
Daniel
Pode ser tambem que a oferta de credito tambem esta inflando os resultados… E de se pensar.
Caro André, parabéns pela matéria.
Os indicativos dos preços cada vez mais altos devem servir de alertas.
A Europa cortou gastos, os EUA com tantas emissões de títulos etc.
Estamos caminhando para uma nova crise, só não se sabe quando (?).
Certamente alguém pagará a conta de tudo isso.
Abraços
Nao há uma dicotomia entre análise austríaca e fundamentalista justamente pq a oferta de credito infla os resultados de balanço das companhias, conforme bem colocado pelo LMarx.
E o Daniel descreveu bem o processo que leva a uma má alocaçao de recursos na economia, com projetos que não deveriam ter saído do papel. Estamos na fase onde os investimentos erroneos realizados no Brasil começam a se revelar! A começar pelos investimentos do Eike/BNDES!
Parabéns André, seu texto gerou boa repercussão entre os leitores. A troca de idéias sempre enriquece.
Abs, Luiz
Fico feliz em ver as ideias da Escola Austríaca sendo difundidas. Antes, ninguém nem ouvia falar acerca dela!! Veja que onde há pessoas instruídas, o debate é altamente técnico! Não há espaço para ofensas e ataques. Parabéns ao André e aos demais colegas!!