Mais importante do que definir um preço alvo da ação, as métricas de avaliação servem para indicar a relação entre as variáveis de custo e receita e o valor justo. Apegar-se a instrumentos de avaliação sem visão crítica pode levar a erros grosseiros.
Praticamente toda terça feira, o ex-ministro Delfim Netto critica em sua coluna no Valor Econômico os economistas que seguem cegamente os modelos econométricos como, por exemplo, o utilizado para calcular o PIB potencial, aquele que define o crescimento máximo que uma economia pode atingir sem que a inflação saia de controle.
O mesmo vale para os instrumentos de avaliação utilizados pela análise fundamentalista. A metodologia do fluxo de caixa descontado permite calcular o valor justo ou preço alvo da ação ao dividir o valor presente do fluxo de caixa da companhia reduzido da dívida líquida pela base acionária. Mas, em minha opinião, mais importante do que definir se a ação vale R$ 20, R$ 20,30 ou R$ 22 é verificar como uma determinada variável de custo ou de receita afeta o preço alvo. Qual a magnitude que uma alteração de uma variável tem sobre o preço alvo.
Outra coisa importante é ser flexível ao comparar empresas utilizando múltiplos – P/L (preço por lucro), FV/Ebitda ou qualquer outro. Vou dar um exemplo real. Tive um chefe engenheiro, logo extremamente cartesiano (não que todos os engenheiros sejam). Na ocasião, eu preferia uma ação que negociava a 4,2 vezes P/L comparada à outra que tinha múltiplo ligeiramente menor de 4,0 vezes. Minha escolha não se restringia a esse múltiplo, mas levava em conta outras variáveis como governança corporativa, pagamento de dividendos, etc. Tal como os economistas citados por Delfim Netto em sua coluna, meu superior estava apegado às métricas. Foi difícil convencê-lo (e até hoje acho que não o convenci de todo).
Quem acompanha o blog já deve ter visto comentários sobre o modelo de Gordon no qual o preço da ação (P) cresce quando os dividendos (D1) e o crescimento do lucro por ação (g) se elevam e a taxa de desconto (k) cai ou vice versa.
Contudo, não utilizo o modelo de Gordon para definir o preço justo da ação, mas para explicar a relação que as variáveis dividendos, taxa de desconto e crescimento do lucro por ação têm sobre o preço do papel.
No último Congresso Value Investing, realizado em São Paulo, Pedro Cerize, fundador da gestora Skopos, utilizou uma exemplo sobre os limites da fórmula de Gordon. Imagine uma companhia que tenha tido um lucro de R$ 1 mil e patrimônio líquido de R$ 5 mil, logo um retorno sobre o patrimônio de 20%. Considerando-se que os acionistas receberam 65% do lucro (o “payout ratio”), o crescimento do lucro (“g”) seria de 7% (g = (1 – “payout ratio”) x o retorno sobre o patrimônio). A taxa de desconto é de 12%. Com isso pelo modelo de Gordon, o preço da ação seria de R$ 13 mil (P = 650 / (0,12 – 0,07)). Mas suponhamos que a companhia tivesse, no decurso do ano, recebido um terreno no valor de R$ 5 mil e esse bem não tivesse gerado renda no período. O lucro permaneceria o mesmo, mas o patrimônio passaria a valer R$ 10 mil com o retorno despencando para 10%. Com isso, também cairia o g, para 3,5% (g = (1-0,65) x 10%). Assim, o valor de mercado da empresa pelo modelo de Gordo deveria cair para R$ 7,6 mil (P = 650 / (0,12 – 0,035)). Um contrassenso, pois a empresa acabou de receber um bem que tende a gerar renda. A queda do retorno sobre o patrimônio foi apenas momentânea.
Por isso, cuidado com o uso irrefletido de fórmulas.
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Andre
Mesmo o terreno nao gerando renda, a empresa recebeu o terreno. Ela nao fez reavaliacao do terreno, ou seja, aquele ativo é novo no balanco. Entao, aquilo é um lucro extraordinario e deve entrar no numerador, nao?
Abs
Oi Alan
A entrada do terreno não vai a resultado. Ele é contabilizado no imobilizado e a contrapartida é o patrimônio líquido, pois o sócio que aportou o terreno recebe ações da companhia. Ele só impactará o resultado, gerando lucro ou prejuízo, quando for vendido. Se for vendido acima do custo, lucro e do contrário, prejuízo.
Abraço
André Rocha
É pq eu entendi que a empresa tinha ganhado o terreno e aquilo não tinha sido uma aporte.