A tributação sobre os dividendos e a ânsia de arrecadar

Os candidatos às eleições presidenciais de outubro têm colocado em debates e entrevistas suas opiniões sobre a crise fiscal brasileira. Ciro Gomes e Rodrigo Maia, por exemplo, defendem a tributação sobre os dividendos com o intuito de aumentar a arrecadação. Mas será que essa política não terá efeitos secundários como a redução dos investimentos? Será que uma economia com níveis de investimentos tão baixos pode se dar ao luxo de abrir mão do investimento das companhias privadas?

Em parceria com Philip Casey, fizemos uma análise sobre o impacto dos dividendos sobre os investimentos com base em um modelo teórico simplificado. O dividendo é a parcela do lucro das companhias distribuída aos acionistas.

Os dividendos eram tributados no país até 1995, quando o artigo 10 da lei 9.249/95 inseriu a isenção dos dividendos sobre os lucros gerados a partir de 1996. A alíquota cobrada era de 15% antes da lei.

Considere uma economia fechada na qual não haja investimento público. Isso não está longe da realidade. O investimento público representou apenas 1,17% do PIB em 2017, enquanto o investimento total atingiu 15,6%, um dos mais baixos da historia recente.

Assim, em nosso modelo, o investimento da economia é realizado somente pelas companhias privadas. O financiamento do investimento das empresas pode ser feito de três formas: por intermédio da emissão de novas ações, levantamento de dívida ou geração de caixa própria.

Financiamento via ações

Quanto maior o valor do equity (capital próprio) da companhia, maior a aceitação de suas ações pelos investidores e, consequentemente, maior a probabilidade de a companhia conseguir lançar novas ações em bolsa de forma a levantar recursos para suportar seus investimentos. O valor do equity da companhia, pelo modelo de Gordon, é dado pela fórmula:

V = Dt+1 / (ke – g) onde

V – valor do capital próprio (equity) da companhia no momento inicial

Dt+1 – dividendos um período a frente

Ke – custo de oportunidade para se investir na companhia

g – crescimento do lucro

Pela equação, pode se ver que o valor do equity aumenta conforme o dividendo distribuído aumenta e/ou o crescimento do lucro se eleva. Em outras palavras, quanto maior o fluxo de caixa gerado ao acionista, maior será o valor de equity da empresa. Com a tributação dos dividendos, o numerador passa a ser Dt+1 *(1 – t), onde t é a alíquota do tributo cobrado sobre o dividendo. Assim, com a introdução da tributação, o valor do equity da companhia (V) cai, pois Dt+1 *(1 – t) é menor do que Dt+1. A geração de caixa para o acionista se reduz. Com isso, a emissão de ações perde competitividade como fonte de financiamento.

Financiamento via dívida

Mas não é somente a captação via equity que pode ser prejudicada. Levantar dívida pode se tornar mais custoso. Considere que as ações da companhia são dadas em garantia pelo empréstimo. Se o valor das ações se reduz com o novo tributo, também se reduz o valor da garantia. Com isso, os juros a serem cobrados da companhia se elevam, pois o risco do empréstimo cresce. Com o custo financeiro mais alto, reduzem-se a gama de investimentos rentáveis. Assim, pela ótica do financiamento via dívida, o investimento da companhia também deve se reduzir.

Os governantes têm que entender que a resolução do problema fiscal do país não pode recair apenas sobre o setor privado. Já bastam os 14 milhões de desempregados, todos oriundos do segmento privado e nenhum do setor público. A arrecadação tributária não pode ser um fim em si mesmo. A tributação dos dividendos pode prejudicar ainda mais o investimento das empresas e, por consequência, o crescimento da economia. A interferência do governo busca resolver um problema, mas pode criar outro ainda maior.

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