As dificuldades de comunicação com o mercado

A empresa que apresenta resultados robustos por um determinado período de tempo terá seu valor de mercado apreciado. O preço da ação é diretamente relacionado ao desempenho operacional da empresa. Contudo, por que em determinados momentos companhias com resultados consistentes não veem seus papéis se valorizarem? Ou, o que é pior, por que ações de firmas com resultados pouco atraentes têm alta procura dos investidores? A resposta está na forma como as empresas se relacionam com investidores e analistas. Constatei durante minha carreira erros cometidos que influenciaram diretamente o preço da ação. A seguir, alguns exemplos.

Recompra de ações

Em tese, quando uma empresa anuncia a compra de suas próprias ações, ela sinaliza que suas ações estão baratas. Em 2008, analisava uma companhia que tinha aberto seu capital recentemente. A tese de investimento era a de que a empresa, com os recursos obtidos no IPO (oferta pública inicial de ações, em inglês), adquiriria concorrentes para diversificar sua área de atuação. Contudo, o preço das ações começou a cair fortemente na esteira da crise do “subprime”. Com isso, a companhia lançou um programa de recompra de ações. Os minoritários reclamaram porque o dinheiro do IPO estava sendo usado para comprar suas próprias ações e não outras empresas, contrariando a tese de investimento.

Em uma reunião, questionado pelo mercado, o responsável  pela área de relação com investidores (RI) cometeu a seguinte gafe: “Precisamos adquirir as ações agora para  dar saída aos acionistas descontentes”. Desnecessário dizer que a resposta causou indignação dos presentes. E o pior é que a estratégia da companhia estava correta. Naquele instante, não havia melhor aplicação para o uso do dinheiro do que comprar suas próprias ações que estavam extremamente baratas. O cenário havia mudado entre o IPO e a crise. Mas a abordagem infeliz do RI maculou a credibilidade da companhia.

Recentemente, indagado por analistas e investidores em teleconferência se a JBS manteria o ritmo na aquisição de outras empresas, o CEO global, Wesley Batista, foi perfeito ao explicar porque passaria a privilegiar o crescimento orgânico: “A equação é simples. Se você olhar o múltiplo da JBS, não há nada no mercado mais barato do que isso. Para fazer uma aquisição, tem que pagar o dobro do múltiplo do que a JBS vale. O que é melhor?”. As duas empresas adotaram a mesma estratégia, mas a forma da comunicação com o mercado foi completamente diferente.

Empresa alvo de aquisições

A mesma empresa citada acima tinha números robustos, mas era pequena, o que facilitava a abordagem de outras empresas. Em uma reunião, um investidor indagou: “Por que sua companhia não se junta à companhia X? Vocês possuem atividades complementares, a fusão geraria várias sinergias”. O responsável pelo RI mais uma vez se atrapalhou: “Meu controlador não aceitaria, pois passaria a ser minoritário na nova empresa”. O investidor   contra-argumentou: “Então seu controlador não quer crescer?”. A resposta correta não era essa, até  porque eu conhecia a visão do controlador. Ele não aceitaria uma oferta naquela ocasião devido a suas ações estarem depreciadas. Contudo, caso houvesse uma valorização da empresa, nada impedia uma venda futura.

Visão de curto prazo

Investidores especulativos pressionam as empresas para apresentar resultados no curto prazo, muitas vezes clamando para o aumento do pagamento de dividendos em detrimento dos investimentos. Segundo pesquisa da consultoria McKinsey realizada entre mil altos executivos e diretores corporativos, 79% relataram pressões para apresentar resultados sólidos em no máximo dois anos, conforme citado por Laura Tyson em artigo publicado no Valor. Além disso, altos executivos possuem, em regra, remuneração calcada no sucesso de curto prazo, o que privilegia decisões corporativas que não levam em conta a perenidade da empresa.

O administrador ético e competente não pode cair nessa cilada. Sua estratégia deve ser atender primeiro a empresa. Se sua ótica estiver certa, os resultados futuros por si só alavancarão o preço da ação. Isso aconteceu recentemente no setor de papel e celulose. Suzano tinha um ambicioso programa de investimentos, bem como a estratégia de reduzir seu elevado nível de endividamento. A empresa soube se comunicar com o mercado orientando o investidor a observar o longo prazo. O preço das ações mais do que dobrou entre o início de 2012 e dezembro de 2015.

John Cryan, um dos principais executivos do Deutsche Bank, disse uma frase exemplar em reportagem do “Financial Times” de janeiro: “Não devemos tentar administrar o valor das ações, devemos administrar o banco”. Ele está certo. O preço da ação é reflexo das atividades da empresa.  Mas isso não significa que os executivos, em especial os do RI, não tenham que entender a cabeça do investidor. Uma narrativa adequada também contribui para a valorização das ações. Cursos e aconselhamentos com profissionais que atuam no mercado podem ser de grande ajuda para os profissionais da empresa e, em consequência, beneficiar a todos: executivos, controladores e minoritários. O tema é extenso. Retornarei ao assunto em outros artigos.


Curso “Sua cia se comunica bem com analistas e gestores?”

O objetivo do curso é mostrar aos participantes como os profissionais do “buy side” e os do “sell side” avaliam as companhias listadas em bolsa de forma a aprimorar a comunicação entre sua empresa e o mercado. O efeito prático será sentido no preço da ação.

Valor: a partir de R$ 5 mil.

Público alvo: controladores e profissionais de relações com investidores

Mais informações: envie e-mail para [email protected]

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