A elevação dos juros, em regra, é negativa para o desempenho da bolsa. Por que isso ocorre? Explico esse movimento de duas formas. A primeira é avaliando as empresas pelo fluxo de caixa descontado. Na segunda, comparo os juros dos títulos prefixados LTN com o múltiplo P/L (preço por lucro) do Ibovespa. Como a expectativa é de alta para os juros no segundo mandato da presidenta Dilma, logo teremos uma bolsa em queda nos próximos meses? A princípio sim, mas a política econômica tem sido tão intervencionista até o momento que a relação entre os juros e a bolsa se desvirtuou desde meados de 2011. Mais um efeito pouco comentado causado pela “nova matriz macroeconômica” empreendida pelo governo Dilma Rousseff.
A metodologia mais utilizada para avaliar uma empresa é o fluxo de caixa descontado. Projeta-se a geração de caixa futura da empresa e se traz o somatório dos fluxos futuros a valor preente a uma taxa de desconto. Com o aumento esperado para a taxa Selic, o valor das empresas tende a ser menor, pois a taxa de desconto também será ajustada para cima. Além disso, a geração de caixa deve cair, pois a demanda para os produtos deve se reduzir e o serviço da dívida das companhias será maior. Como o Ibovespa reúne um conjunto de empresas é de se esperar que nesse cenário, nosso principal índice negocie a um valor menor.
Outra forma de se ver o efeito negativo do aumento dos juros é comparar a evolução da taxa do título público LTN e o múltiplo P/L do Ibovespa. A LTN, a pós fixada LFT, a caderneta de poupança, a bolsa de valores e os demais ativos financeiros concorrem entre si pelo investidor. Assim, com os juros da economia crescendo, a LTN (e a LFT) ficará mais atrativa. A demanda por esse título aumentará e recursos devem sair da bolsa, empurrando seu preço para baixo.
No gráfico abaixo, apresento a evolução da taxa da LTN de dois anos à frente e o inverso do múltiplo P/L (preço por lucro) do Ibovespa nos últimos cinco anos. O lucro é o projetado para os próximos 12 meses obtido do sistema de análise fundamentalista S&P Capital IQ. Simplificadamente, o múltiplo P/L representa o número de anos necessários para o investidor ter o retorno do seu investimento por intermédio apenas dos dividendos. Essa hipótese necessita de premissas não muito realistas: (i) a de que todo o lucro seja distribuído como dividendos e (ii) a de que os lucros futuros sejam iguais. Feita essa ressalva, o inverso do P/L (1/P/L) pode ser caracterizado como o “retorno com dividendos”. Assim, comparei a taxa da LTN com o inverso do múltiplo P/L (que também é uma taxa). Perceba que entre novembro de 2009 e julho de 2011, quando a taxa LTN subia, o “retorno com dividendos” também se elevava (ou, olhando de outro modo, o múltiplo P/L caía), embora com certa defasagem temporal.
Mas, a partir de então, essa correlação não é tão óbvia. Pode-se dizer que a “nova matriz econômica” do governo Dilma desarranjou não somente variáveis macroeconômicas como inflação, dívida pública e transações correntes, mas também desvirtuou a relação usual entre bolsa e juros: quando os juros sobem, a bolsa cai e vice versa.
Vamos analisar dois períodos. O primeiro vai de julho de 2011 a janeiro de 2013. Caso seguisse o padrão usual, a cruzada da presidenta para reduzir os juros (veja como a taxa LTN despenca no período) teria feito o Ibovespa se apreciar o que reduziria o “retorno com dividendos”. Mas não foi o que ocorreu. Essa taxa caIu discretamente, mas permaneceu bem elevada. Por que a bolsa não andou consistentemente no período? Acredito que o mercado não considerou essa queda abrupta dos juros como sustentável o que de fato não foi. Como consequência, o apetite do investidor por risco não aumentou no período.
No segundo momento, que vem desde janeiro de 2013, a taxa da LTN apresentou forte elevação, mas o “retorno com dividendos” vem mantendo-se em níveis baixos. Logo existiria espaço para queda da bolsa e consequente aumento da “taxa de dividendos”. A título de comparação: em janeiro de 2011, a taxa da LTN 2013 estava em 12,98% e o inverso do P/L em julho de 2011 era de 11,4%, atingindo 12,2% em setembro. Hoje, em 25 de novembro, o retorno com dividendos está em 9,1% enquanto a taxa LTN 2016 se encontra a 12,39%.
Que conclusão nós podemos tirar? O mercado está em compasso de espera do anúncio do novo ministro da Fazenda e das medidas fiscais. Caso elas sejam promissoras, o choque de credibilidade pode fazer com que a bolsa mantenha o patamar atual ou até se aprecie (os juros também tendem a cair um pouco). Caso as decisões frustrem as expectativas, podemos ver uma bolsa em queda (logo com aumento da “taxa de dividendos”) corroborando a máxima dos livros texto de que quando os juros sobem, a bolsa sofre. Vamos aguardar.
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