Lições da Marcopolo à Randon

Em reportagem no Valor Econômico, o repórter Sérgio Ruck Bueno trouxe um dado curioso. A Randon, líder no segmento de implementos rodoviários, apesar de vir apresentando receitas superiores às da fabricante de carroceria de ônibus Marcopolo, apresenta valor de mercado que representa metade do dessa última. Além das razões levantadas pela reportagem, existem outras? O que a Randon pode fazer para aumentar seu valor de mercado?

A reportagem “Diferença do valor em bolsa de Marcopolo e Randon supera 100%”, publicada em 27 de agosto, mostra que enquanto o valor de mercado da Marcopolo (POMO4) era de R$ 3,8 bilhões no 2º trimestre de 2014, a capitalização de Random (RAPT4) era de R$ 1,8 bilhão. O interessante é que a Random apresentou receita superior ao de Marcopolo nos últimos 12 meses encerrados em junho/14: R$ 4,2 bilhões versus R$ 3,4 bilhões, respectivamente. Por outro lado, o lucro da fabricante de carroceria de ônibus foi ligeiramente maior: R$ 264,4 milhões contra R$ 256,1 milhões. O texto elenca algumas razões para a maior valorização da Marcopolo:

1) Expectativa positiva de resultados – a definição da regulamentação pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) do regime de autorização para o funcionamento das linhas de ônibus interestaduais tende a incrementar o investimento em novas frotas. De acordo com a estimativa para o lucro de 2015 captado pelo sistema de análise fundamentalista S&P Capital IQ junto a analistas de mercado, o resultado líquido da empresa deve crescer 19,8% entre 2014 (R$ 257,4 milhões) e 2015 (R$ 308,5 milhões). Já para a Randon, a expectativa é de um lucro estável ao redor de R$ 220 milhões. Assim, o múltiplo P/L (preço por lucro 2015) da Marcopolo apresenta um prêmio para o de Randon, 12,98 vezes versus 8,88 vezes, segundo dados da S&P Capital IQ.

2) Menor número de concorrentes – com a saída da Busscar do mercado, a Marcopolo não apresenta competidores de peso, ao contrário da Random que tem que enfrentar, dentre outros, Guerra, Librelato, Fachini e Iochpe Maxion;

3) Maior retorno sobre o patrimônio líquido (RPL) – Nos últimos 12 meses encerrados em junho/14, a fabricante de carroceria de ônibus teve retorno de 18,8% contra 16,9% do de Randon.

4) Melhor nível de governança corporativa – Marcopolo está listada no Nível 2 de governança corporativa da BM&FBovespa e Random no Nível 1.

5) Menor nível de endividamento – Em junho/14, Marcopolo apresentava endividamento líquido sobre Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) de 0,9 vez frente a 1,5 vez da Randon.

6) Maior exposição ao mercado externo – Marcopolo apresentou 35% do total da receita atrelada ao mercado externo no semestre passado. A expectativa da administração da Random é a de que a receita externa alcance US$ 300 milhões, cerca de 13% da receita total.

Além das causas citadas acima, a liquidez de POMO4 é maior. Em agosto, o volume médio diário foi de R$ 4,0 milhões comparados a R$ 1,256 milhão de RAPT4 no mesmo período.

Acredito que uma das razões para o prêmio das ações de Marcopolo sobre as de Randon pode ser explicada pelo menor interesse dos investidores por ações de empresas que atendem a vários setores da economia. Já tratei do tema no post “Por que o mercado não gosta de holdings?”, de 29 de abril último. Randon, embora seja uma empresa do setor de bens de capital e ligada ao segmento de transportes como Marcopolo, fabrica produtos diversificados como semirreboques para caminhões, vagões ferroviários e autopeças de automóveis. Os catalisadores para cada um desses segmentos são distintos o que torna a análise mais complexa, afastando os investidores. Já a Marcopolo é quase um mono produto com variação apenas no tamanho e sofisticação da carroceria.

Vejo algumas estratégias que a administração da Randon pode adotar para aumentar seu valor de mercado. Uma de suas controladas é uma empresa negociada em bolsa, mas com reduzida liquidez: a fabricante de autopeças Fras-le (FRAS3). O cancelamento do registro de companhia aberta com sua transformação em uma subsidiária integral da Randon poderia simplificar a estrutura societária, bem como incrementar a liquidez de RAPT4. Outra medida poderia ser migrar para o Nível 2 ou até mesmo o Novo Mercado da BM&FBovespa o que traria maior visibilidade para as ações de Randon.

A S&P Capital IQ informa que Randon possui cobertura de 14 corretoras, enquanto Marcopolo de 13. Apesar disso, minha experiência mostra que Marcopolo é mais bem acompanhada pelos analistas. Uma comunicação mais eficiente da companhia junto aos agentes de mercado – investidores, analistas e gestores – poderia mudar esse cenário.

Alguns números operacionais das duas empresas como o RPL e o endividamento não são muito diferentes. Logo o prêmio de 46% do múltiplo P/L de Marcopolo sobre Randon pode ser reduzido. Como?

(i) com uma melhor comunicação com o mercado;

(ii) com mudanças estratégicas como maior inserção internacional e a venda de algumas unidades de negócios e

(iii) com ajustes no organograma societário com a simplificação de sua estrutura e a migração para um nível de maior governança corporativa da BM&FBovespa.

Com essas medidas, ganham os controladores e os minoritários da Randon.

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